A atriz Marjorie Estiano, de 42 anos, que interpreta o papel de Carolina na série Sob Pressão, abriu o jogo sobre a quinta e última temporada da série médica da TV Globo. Em entrevista, a artista refletiu sobre a mudança da personagem após descobrir um nódulo na mama e destacou a evolução humana de Carolina ao longo de cinco temporadas do projeto. “Eu sei que meu lugar de aprendiz é pra vida toda e com ela eu ampliei a minha compreensão da profissão”, declarou.
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Como você descreve o momento de Carolina na quinta temporada, levando em consideração o câncer de mama?
Carolina talvez se encontre no auge de uma etapa da vida, bem consigo mesma, inteira, desfrutando da maternidade, mais madura e praticando o novo sentido que a família trouxe pra ela, colocando todo dia um tijolinho na construção desse conceito. A descoberta de um câncer nunca vem em boa hora, não existe momento mais ou menos adequado para se enfrentar uma questão como essa, mas nesse período da vida surpreende muito, desorganiza todas os planos e idealizações. Com a chegada do Francisco, o futuro é um projeto concreto. O tempo, nesse momento da vida, é para ser um parceiro fiel ao seu lado e não o contrário. Carolina vai viver o medo da morte, a negação, a aceitação, a luta dura contra uma doença e todos os efeitos psicológicos e físicos, profissionais e pessoais desse atravessamento. O medo da mudança, essa inversão de papéis (se ver como paciente), medo de tudo. De repente, tudo muda. É um chamado e Carolina passa por essa trajetória vivendo todas as etapas e a transformação que um diagnóstico como esse oferece a alguém.
E a relação dela com Daniel?
Daniel é daquelas figuras na nossa vida, em que a gente olha pra trás e pensa “Onde eu estaria hoje se não tivesse encontrado com ele? Quem seria eu?”. Daquelas pessoas que “naturalmente”, “acaso” ou “destino” , vão apresentando uma direção, uma perspectiva na qual você se inspira. E que não necessariamente vai ter uma continuidade ou presença na sua vida no futuro, mas que fez total diferença naquele período. Talvez sem muita consciência dos desdobramentos no momento em que o encontro se deu, mas, lá na frente, você entende quão fundamental foi pra quem você se tornou hoje ter seu caminho cruzado pelo dele. Daniel é amigo pra vida toda. E uma ponta meio solta que a Carolina deixou num período muito difícil, no início da fase adulta, com muitos conflitos profundos que ainda seriam compreendidos mais à frente. Uma pessoa que deixou muito afeto, confiança e vínculo. Uma combinação necessária pra ela, especialmente nesse momento, e que impulsionou esse reencontro.
De que forma a doença e a chegada desse antigo “amor” interfere no casamento com Evandro?
É o câncer o motor das mudanças, ele mexe com tudo, e uma das principais perguntas que vem junto com ele é: “O que eu fiz com o meu tempo até hoje?”, “Se eu for morrer agora, valeu a pena?”. A ameaça do câncer reestabelece a importância do tempo em muitos sentidos, em especial do tempo no presente. As escolhas na vida passam a ter critérios diferentes. Reflexões muito profundas sobre como quero viver, o que tem realmente valor na minha vida, o que é prioridade, se tornam urgentes e novos balizadores. Questionamentos que propõem uma nova chance, uma vida nova, tenha ela o tempo que tiver. O casamento com Evandro sempre foi um desafio pra Carolina, mas acho que a partir desse mergulho profundo pra dentro dela mesma, um novo caminho se apresenta. Que não necessariamente tem uma projeção em Daniel, não se trata disso. Daniel pode vir a ser um gatilho também, um espelho para ela se perceber e compreender o que está mudando, mas tem muito mais a ver com ela mesma do que com Evandro ou Daniel. É o novo caminho que interessa, o que vai aparecer nele. Ela não sabe, mas quer descobrir.
Câncer de mama é um tema de extrema importância. Como é pra você poder dar vida a uma personagem com essa doença e, consequentemente, poder alertar as mulheres sobre os cuidados e tratamento?
Muito especial estudar esse tema. No mundo, é o câncer de maior incidência entre as mulheres. E conhecer mais intimamente esse assunto é um aprendizado que vou desfrutar também de forma muito prática e concreta na minha vida. É verdade que sempre desfruto de muito aprendizado com ‘Sob Pressão’, mas quando o ponto é especialmente feminino, me sinto muito identificada. Qualquer uma de nós pode passar por um câncer de mama, diretamente ou através de amigos, conhecidos, familiares. E mesmo que isso não aconteça, poder promover saúde é um dos lugares mais prazerosos e gratificantes que vivo junto da série. Pude conhecer histórias lindas, mulheres incríveis, inspirações pra minha vida. Médicas, pacientes, voluntárias. Até por ser uma realidade de muitas mulheres e famílias, a quantidade de histórias compartilhadas preenche muito. Pacientes de faixa etária distinta, de classe social diferente, em fases diferentes na relação com a doença, com o tratamento, recém-diagnosticadas, metastáticas, um compartilhamento muito bonito e generoso.
Acho que na minha vida, foi onde eu vi mais claramente o sentido de palavras como solidariedade, empatia, sororidade e companheirismo. E até minha perspectiva sobre as redes socias se ampliou, percebi como ela pode se tornar um instrumento capaz e forte de união verdadeira, de acolhimento, de informação, de cura, um viés que ainda não tinha observado tão intimamente. Quando abordamos um tema de tamanha relevância pra população, é muito importante ter cautela, principalmente porque o desejo é de oferecer identificação, esclarecimento, amparo, assim como outros temas muito sensíveis que já tratamos. É fundamental que sirva ao espectador, sirva a quem vive direta ou indiretamente essa circunstância e a todos de maneira geral. Tem sido muito mais bonito do que poderia imaginar, me surpreendi muito com tudo que tenho lido, visto e ouvido. Mais uma vez muito grata pela oportunidade.
Vera sempre esteve disponível para ajudar Carolina, e nesse momento do câncer ela também se mostra uma excelente amiga. Fale um pouco dessa relação, por favor.
A ficção é uma versão editada da vida e Vera é uma grande amiga que está presente nos momentos mais sensíveis. A troca é sempre muito respeitosa e considera as particularidades de cada uma. Vera é aquela que acompanha no exame, que fiscaliza, conversa, ampara e cobra. Um registro um pouco diferente do que tinha visto até então. Natural e bom que seja assim, momentos diferentes, posicionamentos diferentes. Relações vivas estão em movimento constantemente e os conflitos podem separar ou fortalecer ainda mais o vínculo e esse foi o caso delas. Trabalhar esse tema com a Drica, em especial, foi muito emocionante. Não só porque é uma atriz extremamente generosa e entregue, mas pela história pessoal dela, por ter enfrentado, pessoa física, um conflito tão extremado ou mais que a Carolina.
Como você avalia a trajetória de seu personagem?
Do filme até a quinta temporada é nítido o amadurecimento dessa mulher e vejo o meu também, tanto profissional quanto pessoal. Nunca tinha feito uma personagem por tanto tempo, nem trabalhado com a mesma equipe. É muito interessante ver o crescimento da Carolina, ver como as experiências vão modificando o comportamento com o passar dos anos. Vejo a Carolina chegando no hospital pela primeira vez, defendida, desprendida, cheia de certezas, mas com sua essência muito clara. Fomos conhecendo aos poucos a bagagem que ela carregava e, ao mesmo tempo, como as circunstâncias foram apresentando oportunidades a ela de encarar e compreender a origem de alguns bloqueios e seus gatilhos. É em um gráfico irregular, cheio de altos e baixos. Uma personagem belíssima, complexa e inesquecível. Tão inesquecível quanto trabalhar com essa equipe. Não tenho dúvida que esses seis anos foram uma faculdade na minha vida. Eu sei que meu lugar de aprendiz é pra vida toda e com ela eu ampliei a minha compreensão da profissão, da relação com os colegas de trabalho, com o coletivo, com o país, comigo mesma. Me sinto muito mais inteira.
A quinta temporada de Sob Pressão é uma coprodução da Globo e Conspiração, sendo escrita por Lucas Paraizo com Márcio Alemão, André Sirangelo, Pedro Riguetti e Flavio Araujo, com direção artística de Andrucha Waddington e direção de Andrucha, Mini Kerti, Rebeca Diniz, Julio Andrade e Pedro Waddington. Com produção de Isabela Bellenzani (Globo) e Mariana Vianna (Conspiração), tem direção de gênero de José Luiz Villamarim.