Com mais de 20 anos de teatro e mais de 10 anos nas telinhas, Maria Eduarda de Carvalho é, sem dúvidas, uma das atrizes mais divertidas da dramaturgia brasileira.
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Pronta para interpretar a interesseira Olga, na nova versão de Éramos Seis, da TV Globo, a atriz fala com exclusividade ao Observatório da Televisão sobre como será sua personagem na novela, fala da pressão de sua filha no mundo artístico, revela suas inspirações na atuação e desabafa sobre os detalhes que a sociedade atual está perdendo.
Confira a entrevista:
Você assistiu às outras versões da novela?
Eu assisti à versão do SBT quando eu era criança. A gente parava tudo para ver essa novela. Tenho uma recordação muito doce dessa época. E tem o fato de que a Denise Fraga fazia a Olga na versão do SBT, que é a mesma personagem que estou fazendo. A Denise é uma atriz de quem sou uma grande fã devota, uma grande inspiração para mim. Quando fui chamada pra fazer a novela e me disseram que eu ia fazer a Olga, foi sensacional.
Como você define a Olga?
A Olga é uma personagem sensacional! Eu tenho um carinho muito grande por ela, porque acho ela muito sem noção, equivocada, e tenho até uma certa peninha dela (risos). Sabe quando a gente está vendo que o filho está fazendo besteira, e precisa deixar ele fazer para entender que está fazendo coisa errada? Sinto exatamente o mesmo pela Olga. Ela é uma personagem dos anos 1920, as mulheres eram ‘reféns’ dos maridos, pouquíssimas trabalhavam, e a Olga começa a novela muito com esse espírito de desejar se casar com um homem de posses. Mas vai haver uma reviravolta interessante. A novela vai por caminhos inesperados, e o amor fala mais alto. Vamos ver várias Olgas numa mesma personagem.
Ela tem algum lado cômico?
Muito! Eu faço par com o Edu Sterblitch. Imagina se não vai ter um alívio cômico desse casal? Às vezes o câmera da novela não consegue segurar o equipamento de tanto rir, e a gente tem que parar a cena. Eu mesma não me aguento.
A Olga se casa com o Zeca, personagem do Edu Sterblitch, certo?
Sim! Eles vão se casar e ter muitos filhos. Será uma família bem engraçada. Ela mora em Itapetininga e ele também. Ela rejeita ele inicialmente, mas como é completamente apaixonada por ele, não tem como. Ela quer casar com um homem rico, mas ele ama ele, que é um farmacêutico, um cara humilde.
Como você vê isso, sendo uma mulher empoderada, ter que rever essas questões de décadas atrás, onde a mulher tinha que se sujeitar a se casar com um homem de posses para ter um status de vida?
Eu acho que tivemos grandes mudanças nesse viés feminino, mas acho que ainda falta muita coisa para uma mulher ter a possibilidade, de fato, de ter os mesmos direitos que um homem na sociedade. A gente ainda é muito subjugada, ainda sofre muito preconceito, então agora, por exemplo, nós vimos as taxas que o feminicídio aumentaram absurdamente, inclusive no início desse governo. A gente vê o quanto ainda precisa andar, e o quanto retrocedeu em tanta outras coisas. O que a gente perdeu foi a delicadeza, a humanidade, a possibilidade de parar e de fato ouvir o que o outro tem a dizer, enxergar o outro. Estamos deixando de enxergar o próximo, e essa novela traz isso em uma potência muito grande.
Você é muito ligada à sua família?
Muito. Eu sou muito agarrada em minha família. Quando eu penso na força que eu tenho de vida, eu tenho certeza que eu herdei e construí isso através da minha família, da relação que a gente tem e estabeleceu. Da minha irmã, da minha avó, da minha filha. Nos fortalecemos muito uns nos outros. A gente se vê com frequência, conversa, se ajuda, é importante como ser humano.
A sua filha está com 9 anos. Você acha que ela tem alguma pretensão artística?
Eu não pressiono. Vivo no teatro, mas do jeito que as coisas estão nem sei que conseguiremos ser artistas no futuro. Não torço para ela seja, porque é muito sofrida a carreira do artista, sobretudo num país que não valoriza a cultura. Isso se torna um eterno recomeçar. Toda profissão é difícil, mas espero que ela faça algo que ame. Eu descobri que queria ser artista aos seis anos de idade e depois pensei ‘preciso dar um jeito de sobreviver nessa carreira senão serei muito frustrada’.
Como é a personalidade da sua filha?
Ela é muito autêntica, tem muita personalidade, é muito decidida. Se ela não quer, ela não quer mesmo. No aniversário de 9 anos, me pediu para pintar o cabelo de azul, perguntei se ela queria aquilo mesmo porque sou muito de ponderar, e ela disse que queria mesmo. Ela é muito figura! Outro dia ela tava falando sobre amor comigo e eu disse que eu descobri um amor diferente depois que ela nasceu, que era o maior amor da minha vida, porque ela estava me perguntando o quanto eu a amava ela.
Você tem atrizes nas quais você se inspira?
Eu tenho umas atrizes xodó, além da Denise Fraga. A Drica Moraes por exemplo. E eu fui aluna da Camila Amado, há muito tempo atrás quando eu tinha meus 20 anos, e agora estou contracenando com ela.
E você já tentou algum contato com a Denise Fraga?
Não. Eu sou muito matuta, eu tenho vergonha! Mas com o Edu aconteceu o seguinte: O Osmar Prado foi convidado para o nosso workshop de estreia, e ele falou muito sobre o Zeca (versão do SBT – 1994) e eles se encontraram ali. Tem também a Jussara Freire que fez a Olga na Tupi e depois fez a Clotilde no SBT. Mas o Osmar e o Edu se conheceram ali. Se a Denise tivesse ido, eu acho que eu teria coragem de me aproximar.
Na trama, as irmãs vivem uma cobrança em relação ao casamento. Com você nos dias de hoje aconteceu isso?
Na verdade não. Sou filha de pais que tiveram vários casamentos e desde muito nova eu falava que não queria isso para mim. Eu me casei, tive uma filha com o meu ex-marido, ficamos quase dez anos juntos, porque aquilo fazia muito sentido. A parceria afetiva quando é positiva engrandece muito a nossa vida. Mas casar só por casar, Deus me livre!
Éramos Seis é do tipo daquela nova que a gente não assiste com o celular na mão, porque a gente quer ver todos os detalhes, não é?
Essa novela traz um pouco do que perdemos, como ouvir o outro, sem estamos com a cabeça em 300 coisas que temos que dar conta ao longo do dia, sem olhar Whatsapp. Essa novela é um resgate, de enxergar, praticar o afeto, ter empatia, perceber que o outro é como você, e que estamos juntos no mesmo barco.
Você sempre faz essas personagens de época. É um estilo que você prefere?
Na verdade eu curto boas histórias, sejam elas quais forem. Eu acho que tive uma sorte muito grande de emendar esses dois últimos trabalhos, que eram personagens mais contundentes na trama. Tanto em O Tempo Não Para, quanto Éramos Seis são histórias muito potentes, muito poderosas. O Tempo Não Para tinha uma crítica social que eu achava super importante e relevante, e eu acho que Éramos Seis traz essa humanidade que perdemos no caminho, que é muito importante a gente resgatar.
*Entrevista feita pelo jornalista André Romano