ANÁLISE

O que a Netflix quer com a taxa cobrada por compartilhamento de conta?

Tática da gigante do streaming visa apenas o capital

Publicado em 19/03/2022

A Netflix causou rebuliço ao anunciar a cobrança de uma taxa por compartilhamento de conta, tentativa de frear a prática ilegal que fere os termos de uso da plataforma. Três países foram escolhidos como cobaias (Chile, Costa Rica e Peru), nos quais o assinante pode escolher pagar uma tarifa extra para dividir o acesso com mais duas pessoas fora da própria casa. Afinal, o que a gigante do streaming quer com isso?

A resposta simples é: dinheiro. A empresa visa lucrar com a possibilidade de colocar em prática essa cobrança em todo o mundo, apostando na boa vontade dos clientes de pagar a taxa, cerca de US$ 3 (R$ 15) no valor estipulado inicialmente. 

O plano é vender tal estratégia como algo muito atrativo e benéfico, pois a cobrança extra é menor do que o valor cheio de uma assinatura, ainda mais se dividido por dois (sairia por cerca de R$ 7; o plano básico, com direito a somente uma tela simultânea, custa R$ 25,90).

Ainda não se sabe ao certo se essas duas pessoas a mais no plano serão inseridas na lista de assinantes da Netflix (pode ser um truque para aumentar o número de clientes e satisfazer o mercado financeiro). No entanto, em um primeiro momento o que importa é o lucro.

Money, dinheiro

Desde 2011, pré-investimento na criação de conteúdo, a Netflix pegou US$ 15 bilhões (R$ 75 bilhões) emprestados de diversas fontes. Foi um longo processo até chegar, dez anos depois, no balanço neutro. De 2022 em diante, a empresa prometeu aos investidores ter mais dinheiro entrando no caixa do que saindo.

Para fechar o balanço financeiro no verde, é necessário receber mais do que gastar. E a Netflix gasta bastante. Na outra ponta, muitos analistas creem que, pensando na Europa e nos Estados Unidos, o streaming está próximo do teto de assinantes (no resto do mundo, há espaço para crescer em regiões como Ásia-Pacífico, África e Oriente Médio).

Particularmente nos EUA, não caiu bem o aumento no preço da assinatura anunciado em janeiro, o terceiro em três anos. A Netflix sofreu um baque em bolsas de valores ao redor do mundo e perdeu valor de mercado.

A alternativa de ganho seria essa taxa por compartilhamento de conta. O curioso é que, há quase dez anos, quando a empresa visava expansão, essa prática era até incentivada pelos executivos. Atualmente, todos sabem que dividir senhas é muito comum e difícil de impedir (bloqueio, por exemplo). O jeito é tentar lucrar com isso.

É vital pontuar o fato que a tarifa foi criada para ser uma opção. Ou seja, a pessoa escolhe pagar essa taxa e, então, compartilha a conta. Contudo, não se pode descartar uma medida mais agressiva da empresa, a de obrigar o pagamento da taxa assim que alguém dividir a senha com outra pessoa fora da residência.

Nesse debate todo, de lucro a aumento de assinantes, entrou a questão da privacidade. É notório que empresas de tecnologia acessa dados dos usuários assim que alguém afirma ter lido os termos de uso. Mas qual o limite da invasão de privacidade feita pela Netflix?

Exemplo: o Procon-SP notificou a Netflix brasileira a dar explicações sobre a taxa. Entre os vários questionamentos está um bem válido: “como [a empresa] comprovará que o acesso está sendo realizado fora da residência do assinante?”

Essa repercussão toda, com certeza, será tema do relatório trimestral da Netflix do próximo dia 19, comentando os resultados dos três primeiros meses de 2022. A companhia pode recuar, devido às reações negativas, ou provar ser uma empresa capitalista como é e simplesmente tocar o projeto custe o que custar; e como consequência perder um assinante para a pobreflix. ⬩

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