Tempo de Amar, novela de Alcides Nogueira e Bia Correa do Lago, baseada em argumento de Rubem Fonseca, teve seu último capítulo exibido na noite de ontem (19), provando duas coisas: o folhetim clássico, baseado em grandes histórias de amor, ainda têm público cativo quando bem feito; e, mesmo com moldes clássicos, é possível modernizar a narrativa tradicional.
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Do folhetim clássico, a novela das seis da Globo trouxe a história de um amor baseada em encontros e desencontros (com muito mais desencontros que encontros, diga-se), ao centrar sua trama no casal Inácio (Bruno Cabrerizo) e Maria Vitória (Vitória Strada). Os dois se apaixonam perdidamente logo no primeiro capítulo, mas uma série de reveses, entre eles a contrariedade do pai da mocinha, José Augusto (Tony Ramos), e as armações de Delfina (Letícia Sabatella), fazem com que eles se separem. Ela, grávida, vai parar num convento, enquanto ele parte de Portugal para o Brasil, sem saber o que de fato aconteceu.
Neste contexto, Inácio e Maria Vitória demoraram a se reencontrar. E muito! Enquanto ele cai nas garras da vilã Lucinda (Andreia Horta), ela passa por poucas e boas. É separada da filha, quase se torna prostituta e sofre horrores em busca do amado. Mas tem mais sorte que seu par ao conquistar uma nova companhia: o bom-moço Vicente (Bruno Ferrari). E os dois formam um lindo par, enquanto Inácio cai em toda armadilha possível de Lucinda.
Há aí a primeira “novidade” no folhetim proposto por Tempo de Amar: normalmente frágil e indefesa, a mocinha aqui é forte e cheia de opinião. Já o mocinho, quase sempre o herói perfeito, aqui é ingênuo e pouco ativo. Inácio acabou carregando o ingrato papel de vítima das circunstâncias, enquanto Maria Vitória conseguiu se refazer. Ou seja, “mocinho” e “mocinha” tiveram os papeis que normalmente exercem no folhetim invertidos. Por conta disso, a novela caminhou naturalmente para outro final “moderno”, em detrimento ao seu folhetim tradicional, e os mocinhos não ficam juntos. Inácio e Maria Vitória até se reencontram, mas ela já está numa nova história. O lindo amor entre ambos, então, não sobreviveu aos desencontros, e Maria Vitória (sim, a mocinha) escolheu ficar com Vicente.
Além da trajetória pouco usual da mocinha, Tempo de Amar narrou outras histórias de mulheres fortes. Neste campo, destaca-se Celeste Hermínia (Marisa Orth), a mãe de Maria Vitória. Cantora de fado respeitada, enfrentou dignamente sua história de amor com um homem casado, sofrendo o ônus e o bônus de sua opção até chegar ao final feliz. Neste meio tempo, viveu ainda um pequeno triângulo amoroso quando reencontrou o ex, José Augusto, nesta fase envolvido com Madame Lucerne (Regina Duarte), a dona de um cabaré que fingia ser uma “senhora distinta”. Pena que a trinca durou pouco, pois rendeu ótimos momentos. Marisa Orth, Tony Ramos e Regina Duarte viveram ótimos momentos. E a novela mandou bem ao apostar no tema do feminismo, tão em voga atualmente, mas que já existia nos anos 1920. Foi uma boa e oportuna abordagem.
Outro trunfo de Tempo de Amar foi o diálogo estabelecido com outras novelas, fazendo a alegria dos fãs do folhetim televisivo. As homenagens foram vistas desde a revelação de Madame Lucerne, que contou já ter se envolvido com Edu Figueiroa (personagem de Tony Ramos em Rainha da Sucata, trama em que o ator e a atriz também viveram par romântico), até a presença de Ester Delamare (Malu Mader), a Baronesa de Sobral de Força de um Desejo (novela de Alcides Nogueira e Gilberto Braga de 1999), que se revelou a mãe de Carolina (Mayana Moura).
A boa audiência e repercussão de Tempo de Amar, que teve a dura missão de substituir a ótima Novo Mundo, mostra que há, sim, público para novelas de moldes mais clássicos. E também mostrou que é possível imprimir novidades no folhetim clássico, sem perder sua essência. Tempo de Amar foi, antes de tudo, uma história de amor. Com um desfecho que dialogou com a modernidade.
The Wall é uma boa novidade do Caldeirão do Huck
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