Assistir Laços de Família 20 anos depois de sua exibição original faz o espectador se atentar a detalhes que podem ter passado despercebidos anteriormente. Em 2000, quando Camila (Carolina Dieckmann) se apaixona pelo namorado da mãe, Helena (Vera Fischer), e começa a agir de maneira controversa, toda a audiência se volta contra a garota, que se mostra capaz de trair a própria mãe. Porém, no contexto atual, quando se discute a masculinidade tóxica de maneira mais intensa, é mais fácil notar a culpa de Edu (Reynaldo Gianecchini) no imbróglio.
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Quando se descobre apaixonada por Edu, Camila até tenta lutar contra este sentimento. Mas, aos poucos, começa a se entregar a ele. Ela chega a desabafar com Helena, que se mostra compreensiva, e diz que vai abafar este amor. Mas, na prática, ela segue alimentando-o, ao ponto de brigar com a mãe e se colocar numa disputa com ela, o que rende momentos muito dramáticos para ambas.
Mas Edu também não agiu direito com Helena. Quando a esteticista se ausenta, para se despedir do pai, o rapaz não se cansa de cercar a garota com convites. Edu passa todo o tempo procurando Camila, convidando-a para almoçar, ou para visitá-lo em casa. Por mais que possa haver uma amizade entre um rapaz e a filha de sua namorada, eles ainda não tinham um vínculo tão forte que justificasse estas atitudes.
Pelo contrário. Ao se fazer constantemente presente na vida de Camila enquanto Helena estava fora, Edu alimentou o sentimento da jovem, e o seu próprio sentimento também. Com isso, Edu se mostra tão pouco confiável quanto a própria Camila. Nenhum dos dois pareceu interessado em respeitar a ausência de Helena. Logo, os dois a traíram.
Machismo
Há 20 anos, a cultura do machismo ainda era considerada quase como um fator biológico. Tanto que Laços de Família está repleta de homens que agem em nome de seus “impulsos masculinos”. A história de Pedro (José Mayer) e Cíntia (Helena Ranaldi) é a mais evidente, mas isso também pode ser percebido em outras relações, como a de Alma (Marieta Severo) e Danilo (Alexandre Borges).
Neste contexto, sob este olhar do ano 2000, Edu não pareceu tão culpado assim. Todo o conflito familiar envolvendo Helena e Camila fez com que a jovem fosse apontada como culpada. Tanto que ela foi alvo de campanhas no nível “Eu Odeio Camila” na época. Ela só ganhou alguma compaixão da audiência quando ficou doente. E olhe lá!
Enquanto isso, Edu foi considerado mais como um homem apático. Que simplesmente se deixava levar. Hoje dá pra ver que não era bem assim. O médico agiu de maneira errada também. Foi tão culpado quanto Camila. Helena foi a grande vítima do namorado e da própria filha.
Por isso é tão interessante rever uma obra um pouco menos recente. Observar o quanto mudamos enquanto sociedade, ao ponto de não considerar normal o que era normalizado no passado, é um exercício necessário. E que nos faz pensar no que evoluímos (e no que não evoluímos). O texto de Manoel Carlos expõe uma sociedade que, bem ou mal, já se transformou.
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