Depois de 17 anos, o bordão “Ô, coitado!” está de volta à TV aberta. Filomena, empregada doméstica criada por Gorete Milagres, integra o elenco do humorístico Nóis na Firma, que estreia neste sábado (3) na Band. No programa, ela foi “promovida”: deixa a limpeza passa a servir cafezinho em uma empresa à beira da falência (um coworking, ou “cuork” no sotaque da personagem). Até retornar à televisão, a atriz precisou enfrentar traumas e “exorcizar” mágoas. À coluna, ela avalia estar em sua melhor fase.
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Na nova casa, Gorete já fez Filó aprontar no Jornal da Band. Serviu cafezinho à dupla de apresentadores e chamou o âncora Eduardo Oinege de “Eduardo Nhoque”, apontando para a suposta bermuda que ele escondia na bancada. “Invadir” um telejornal não estava nos planos da comediante, que chegou a investir em outro ramo pela falta de oportunidades na TV.
“Em um ano, fiz cinco mudanças. Mudei inclusive de cidade. Deixei São Paulo e construí um empreendimento em Jericoacoara (CE) para ter uma ocupação se faltar trabalho. Fiz um plano B de carreira e de sobrevivência. Fiquei muito feliz e grata pela Band ter se lembrado de mim. A volta da Filó à TV aberta era uma coisa que eu já imaginava que não fosse acontecer mais”, admite Gorete em entrevista exclusiva.
Convidada pelo grupo Café com Bobagem, que em 2020 trocou o SBT pelo Grupo Bandeirantes, a atriz forma uma verdadeira seleção da comédia, com artistas do porte de Marcelo Médici e Moacyr Franco. O reencontro com o veterano da TV em um novo programa foi ainda mais especial para Gorete.
“Nunca perdi contato com o Moacyr Franco. Ele esteve presente nos meus aniversários e em comemorações. Quando Pedro & Bianca [série da TV Cultura da qual Gorete participou] ganhou o Emmy, ele estava em casa. É uma pessoa que tenho forte no meu coração. Ao contrário do que falavam, que nós éramos inimigos e nos odiavam, é tudo mentira. É calúnia que hoje é fake news. Havia um desejo muito grande meu e dele por esse reencontro. Reencontrá-lo é sempre delicioso, com abraços demorados e declarações de amor o tempo todo. Moacyr Franco é um homem apaixonante. Ele continua a mesma pessoa, com a mesma energia, a mesma criatividade, a mesma lucidez. Temos ali um patrimônio, uma lenda viva da televisão, um cantor maravilhoso. É um amor, ele está muito feliz para quem está com 86 anos. É um reencontro com muito amor, respeito e admiração mútuos”, celebra.
As mentiras mencionadas por Gorete remetem ao seu auge na televisão, quando liderava a audiência com seu quadro fixo em A Praça É Nossa. A Globo tentou contratá-la por duas vezes, mas Silvio Santos conseguiu segurá-la no SBT e lhe ofereceu um programa próprio, Ô… Coitado!. A intérprete de Filó confessa arrependimento por não ter trocado de emissora.
“Há uns 10 anos, encontrei uma atriz que confundem comigo. Ela: ‘Não sou aquelazinha desdentada do outro canal’. Olhei para ela e falei: ‘A Filomena? Sou eu’. Sofri muito preconceito da classe artística por ter interpretado uma empregada doméstica e por ter trabalhado no SBT. Passei em um teste, mas o diretor estava na dúvida porque eu era do SBT. Há o preconceito, ator só pode ser da Globo. Não fui global porque, infelizmente, eu fiz uma opção errada ficando no SBT. Ouvi isso: ‘Não vá para a Globo porque a Globo vai te descaracterizar, ela quer acabar com você porque você é campeã de audiência’. Acabei não indo e aconteceu comigo na própria emissora que falou que Globo iria fazer isso. Foi muito frustrante, foi muito doloroso todo esse processo, porque fui simplesmente a bala de um revólver em uma guerra de ibope. Isso tudo foi muito traumático, muito difícil. Sobrevivi porque sou uma pessoa forte. Fiz um pé de meia, tive condições de continuar vivendo. Depois fui recebendo os outros trabalhos e mostrando quem eu era. Fiz novela na Record, fiz drama, lutei fora da guerra por ibope e deu certo. Agora estou em um momento mágico da vida, de entendimento de tudo, de maturidade, anos de terapia para tirar os traumas e as mágoas. E agora veio a Band com esse presente, estou muito feliz e grata”, analisa.
Gorete adaptou a personalidade de Filó para Nóis na Firma. Até antes da pandemia, a personagem vivia uma crise em função da PEC das Domésticas, que ampliou os direitos trabalhistas da categoria e desagradou patrões. O retorno à TV aberta também representa uma superação para Gorete Milagres após encerrar uma rixa pública com Carlos Alberto de Nóbrega (com direito a um desabafo nas redes sociais) sem reconciliação.
“Fazer aquele vídeo em minha defesa foi tirar um peso de 15 anos de calúnias das costas. Tinha muito respeito e gratidão a essa pessoa, mas ali eu vi que precisava arrematar aquele tiro no peito que me deram, que eu precisava tirar aquela bala, costurar e cicatrizar aquela dor. Depois daquele dia, foi uma renovação de alma. É como se eu tivesse renascido. Foi muito bom para minha alma, para minha autoestima, para tudo. Exorcizei um problema. Não guardo mágoa de ninguém. Agora é vida nova. Estou muito plena e feliz”
Gorete Milagres
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