1º período
Em dezembro de 1951, pouco mais de um ano após a televisão ser inaugurada no Brasil, a TV Tupi colocou no ar a primeira novela: Sua Vida me Pertence. Como ainda não existia o videoteipe, tudo era feito ao vivo. Os 15 capítulos da trama foram exibidos às terças e quintas-feiras. O que se produzia na época eram histórias parceladas em duas ou três apresentações por semana. Descobriu-se então que, para segurar o público, era necessário criar o hábito de mantê-lo diante do aparelho de TV todas as noites, no mesmo horário.
A primeira telenovela diária foi ao ar em 1963: 2-5499 Ocupado, uma produção da TV Excelsior lançada como uma opção despretensiosa. Na época, não se podia imaginar que também estava sendo lançada a maior produção de arte popular da nossa televisão, além de grande fenômeno de massa, depois do carnaval e do futebol. A modificação no gênero estava feita e a telenovela consolidou-se de vez ante o telespectador.
Em 1964, Ivani Ribeiro escreveu dois sucessos: A Moça Que Veio de Longe, para a Excelsior, adaptada do original argentino; e Alma Cigana, para a Tupi, do original cubano. Estes primeiros títulos eram baseados em dramalhões latinos. O estilo continuou o mesmo das novelas radiofônicas, tão características, e bem aceitas, na América Latina e no Brasil.
O primeiro grande sucesso veio em 1965, pela TV Tupi: O Direito de Nascer, adaptação de Talma de Oliveira e Teixeira Filho do original cubano de Félix Caignet. No mesmo ano Ivani Ribeiro escreveu outro êxito: A Deusa Vencida, para a Excelsior.
2º período
A partir da segunda metade dos anos 1960, todas as emissoras passaram a investir decisivamente no gênero: Excelsior, Tupi, Record e Globo. Entretanto, a telenovela brasileira, mesmo dominando a programação, ainda não havia se libertado das origens radiofônicas e do estilo dramalhão herdado dos mexicanos, cubanos e argentinos.
É nesse cenário que ganha força a figura da cubana Glória Magadan, conhecedora dos mistérios que transformavam uma novela em sucesso, mas sem comprometimento algum com a realidade brasileira. Suas histórias se passavam na corte francesa, no Marrocos, no Japão, na Espanha, com condes, duques, ciganos, vilões cruéis, mocinhas ingênuas e galãs virtuosos e corajosos. São exemplos: Eu Compro Esta Mulher, O Sheik de Agadir, A Rainha Louca, O Homem Proibido – todas produzidas pela TV Globo, recém-inaugurada. Em 1967, a emissora carioca contratou Janete Clair para auxiliar Magadan. Ela roteirIzou Anastácia, a Mulher Sem Destino e, em 1968, Sangue e Areia.
Nessa fase, Ivani Ribeiro despontava com suas novelas produzidas pela TV Excelsior – entre outras Almas de Pedra, Anjo Marcado, As Minas de Prata, Os Fantoches. Destaque também para Redenção, escrita por Raimundo Lopes, entre 1966 e 1968 – famosa por ter sido a mais longa novela da teledramaturgia nacional: 596 capítulos.
3º período
No final dos anos 1960, o gênero já estava solidamente implantado, graças às inúmeras produções dos últimos cinco anos. Houve então a necessidade de uma mudança no estilo. O essencial era transformar a telenovela EM uma arte genuinamente brasileira. Foi na Tupi que novas fórmulas em linguagem foram introduzidas. O primeiro passo foi dado com Antônio Maria, sucesso escrito por Geraldo Vietri entre 1968 e 1969. Todavia, o rompimento total deu-se em 1969, com Beto Rockfeller, idealizada por Cassiano Gabus Mendes e escrita por Bráulio Pedroso. As fantasias dos dramalhões foram substituídas pela realidade, pelo cotidiano. A novela seguinte também foi um grande êxito: Nino, o Italianinho, de Vietri.
Na Excelsior, destacaram-se três títulos de sucesso entre 1968 e 1970: A Pequena Órfã, de Teixeira Filho; A Muralha, adaptação de Ivani Ribeiro do romance de Dinah Silveira de Queiróz; e Sangue do Meu Sangue, de Vicente Sesso.
Na Globo, os dramalhões de Glória Magadan estavam com os dias contados. Janete Clair ainda escreveu, sob a supervisão dela, Passo dos Ventos e Rosa Rebelde, entre 1968 e 1969. O rompimento foi total a partir de Véu de Noiva, que estreou no final de 1969, marcando o início do quarto período.
4º período
A partir de 1970, a telenovela brasileira não era mais a mesma. Já não havia mais espaço para os dramalhões latinos e todas as emissoras aderiram à nacionalização do gênero. A Globo radicalizou ao demitir Glória Magadan e mudar os títulos em seus três horários de novelas. Às sete horas, saiu A Cabana do Pai Tomás e entrou Pigmalião 70; às oito, saiu Rosa Rebelde e entrou Véu de Noiva; e, às dez da noite, saiu A Ponte dos Suspiros e entrou Verão Vermelho. Todas as três, sucessos daquele início dos anos 1970.
Esse foi o primeiro passo da Globo para tornar-se líder na teledramaturgia brasileira, criando um padrão próprio, aplaudido aqui e lá fora. Depois da década de 1970, as telenovelas sofreram influências do avanço dos tempos, mas sem grandes variações de estilo. Pode-se então fazer uma análise nas cinco décadas subsequentes.
Anos 1970
A TV Excelsior, líder em produção de telenovelas nos anos 1960, fechou suas portas em 1970. A Record nunca conseguiu se equiparar às suas concorrentes no gênero, visto que, na época, investia mais em programas musicais. Porém, entre 1970 e 1971, Lauro César Muniz escreveu para a emissora dois relevantes sucessos: As Pupilas do Senhor Reitor, adaptação do romance de Júlio Diniz, e Os Deuses Estão Mortos.
A TV Tupi, pioneira na mudança do gênero, tornou-se então a principal concorrente para a Globo. Durante toda a década, vários títulos se tornaram sucessos. Entretanto, mesmo assim, nunca chegaram a abalar a hegemonia da emissora carioca: Mulheres de Areia, Os Inocentes, A Barba Azul, A Viagem, O Profeta, Aritana – todas de Ivani Ribeiro, escritas entre 1973 e 1979; Vitória Bonelli e Meu Rico Português, de Geraldo Vietri; O Machão, de Sérgio Jockyman; Ídolo de Pano, de Teixeira Filho; Éramos Seis, de Silvio de Abreu e Rubens Ewald Filho; e Gaivotas, de Jorge Andrade.
No final dos anos 1970, com a decadência da Tupi, a TV Bandeirantes entrou no páreo e lançou Cara a Cara, de Vicente Sesso, que reunia astros da Tupi e da Globo.
Entretanto, foi dos estúdios da TV Globo que, a partir de 1970, saíram os maiores êxitos da teledramaturgia nacional. Logo depois de Véu de Noiva, Janete Clair escreveu Irmãos Coragem, um grande sucesso. Seguiram-se títulos marcantes da autora: Selva de Pedra, Pecado Capital, O Astro e Pai Herói.
Dias Gomes, depois de Verão Vermelho, criou um estilo próprio, bem brasileiro, e lançou o realismo fantástico na TV: Assim na Terra como no Céu, Bandeira Dois, O Bem-Amado, O Espigão, Saramandaia.
Bráulio Pedroso, que vinha do sucesso de Beto Rockfeller da Tupi, usou de humor para criticar a burguesia no horário das dez da Globo, em títulos como O Cafona e O Rebu.
Cassiano Gabus Mendes estreou como novelista na Globo em 1976. Com Anjo Mau e Locomotivas, criou um padrão ideal para as novelas das sete de então: charmosas comédias românticas.
A partir de 1975, a Globo passou a preencher o horário das seis com adaptações de obras da Literatura Brasileira. Lançou requintadas produções de época: Senhora, A Moreninha, Escrava Isaura, Maria Maria, A Sucessora, Cabocla.
Gilberto Braga, depois de alguns êxitos às seis horas – Escrava Isaura, um recorde de exportação, e Dona Xepa – estreou no horário nobre em grande estilo, em 1978, com Dancin’ Days, um sucesso arrebatador.
Outros títulos de destaque da década: Os Ossos do Barão, de Jorge Andrade; Escalada, de Lauro César Muniz; Estúpido Cupido, de Mário Prata; e Gabriela, adaptação de Wálter George Durst do romance de Jorge Amado.
Anos 1980
Na primeira metade da década de 1980, a TV Bandeirantes investiu em dramaturgia, mas sem grandes resultados. Os maiores destaques foram Cavalo Amarelo, de Ivani Ribeiro, Os Imigrantes, de Benedito Ruy Barbosa, e Ninho da Serpente, de Jorge Andrade.
O SBT, inaugurado no início da década, começou importando novelas latinas e produzindo adaptações importados. Porém, todas inferiores em produção e texto.
Com o surgimento da TV Manchete, novas produções surgiram, mas também com pouca repercussão. Os maiores sucessos da emissora na década foram Dona Beija e Kananga do Japão, escritas por Wilson Aguiar Filho.
A Globo continuou liderando a audiência. Gilberto Braga escreveu alguns sucessos (como Água Viva, em 1980), mas foi Vale Tudo, de 1988, a sua melhor novela.
Cassiano Gabus Mendes continuou obtendo êxito com suas comédias leves às sete horas: Elas por Elas, Ti-ti-ti, Brega e Chique e Que Rei Sou Eu?.
Silvio de Abreu trouxe um novo gás para o horário das sete com novelas carregadas de humor pastelão: Guerra dos Sexos, Cambalacho e Sassaricando.
Ivani Ribeiro estreou na Globo em 1982 com Final Feliz – todos os seus demais trabalhos foram remakes ou baseados em antigos sucessos, como A Gata Comeu, que repetiu o êxito da novela original, A Barba Azul, da Tupi.
Em 1986, às seis horas, Benedito Ruy Barbosa adaptou com êxito o romance Sinhá Moça, de Maria Dezonne Pacheco Fernandes. E Walther Negrão se destacou com títulos como Direito de Amar e Fera Radical.
Contudo, foi com Roque Santeiro, um dos maiores sucessos da dramaturgia nacional, escrita por Dias Gomes e Aguinaldo Silva, que os anos 1980 alcançaram o seu ápice. A novela, que havia sido vetada pela censura do Regime Militar em 1975, retornou em nova produção e conquistou o país de ponta a ponta.
Outros títulos de destaque foram Baila Comigo, de Manoel Carlos; Vereda Tropical e Bebê a Bordo, de Carlos Lombardi; Roda de Fogo e O Salvador da Pátria, de Lauro César Muniz; Top Model, de Walther Negrão e Antônio Calmon; e Tieta, de Aguinaldo Silva, adaptada do romance de Jorge Amado.
Anos 1990
A década de 90 foi marcada pela guerra pela audiência. Se o telespectador trocasse de canal por não gostar de uma trama, ajustava-se a obra ao seu gosto. Foi assim com O Dono do Mundo, de Gilberto Braga, em 1991, e Torre de Babel, de Silvio de Abreu, em 1998.
O SBT, apesar de continuar importando dramalhões latinos, chegou a investir em alguns títulos com requintada produção, como o remake de Éramos Seis, de Silvio de Abreu e Rubens Ewald Filho, em 1994.
Uma novela produzida pela TV Manchete conseguiu abalar a hegemonia da Globo: Pantanal, de Benedito Ruy Barbosa, em 1990. A Globo recusara a sinopse e Benedito apresentou-a então à Manchete. A novela foi um sucesso arrebatador. De volta à Globo, Benedito ganhou status e regalias de um autor de horário nobre e escreveu alguns dos maiores êxitos da década: Renascer, O Rei do Gado e Terra Nostra.
Aguinaldo Silva firmou-se como autor de sucesso ao escrever tramas regionalistas de apelo popular com boa dose de realismo fantástico, como Pedra Sobre Pedra, Fera Ferida, e A Indomada.
Silvio de Abreu foi para o horário nobre e se destacou com Rainha da Sucata e A Próxima Vítima.
Neste período, Ivani Ribeiro escreveu suas melhores novelas na Globo – os remakes de Mulheres de Areia e A Viagem – e faleceu em seguida, em 1995.
Outros títulos de destaque: Barriga de Aluguel, de Glória Perez; Vamp, de Antônio Calmon; Quatro por Quatro, de Carlos Lombardi; Por Amor, de Manoel Carlos; e Xica da Silva, de Walcy Carrasco, produzida pela TV Manchete.
Anos 2000
A chegada do novo século mostrou o quanto a telenovela mudou desde o seu surgimento. Na maneira de se fazer, de se produzir. Virou indústria, que forma profissionais e que precisa dar lucro. A guerra da audiência continuou, claro. Porém, a telenovela manteve-se calcada no melodrama folhetinesco, pois sua estrutura é a mesma das antigas radionovelas. O maior exemplo é O Clone, de Glória Perez, um “novelão assumido” e sucesso arrebatador.
A Record TV, a partir do relevante sucesso da nova versão de A Escrava Isaura, escrita por Tiago Santiago, passou a investir pesado em dramaturgia, almejando posições da Globo na supremacia em produções de novelas. Nesta fase, iniciada em 2004, seguiram-se alguns êxitos, como Prova de Amor e Os Mutantes, de Tiago Santiago, Poder Paralelo, de Lauro César Muniz e Vidas Opostas, de Marcílio Moraes.
A Globo obteve alguns grandes sucessos pela década, mas a audiência das novelas (e da televisão em geral) era cada ano menor, reflexo da popularização de mídias que passaram a roubar audiência da TV aberta – como a TV a cabo, a Internet, o streaming -, das mudanças de comportamento da sociedade e, até, de uma certa saturação do gênero.
Títulos de destaque na década: Laços de Família e Mulheres Apaixonadas (de Manoel Carlos), O Cravo e a Rosa, Chocolate com Pimenta, Alma Gêmea e Caras e Bocas (de Walcyr Carrasco), Da Cor do Pecado, Cobras e Lagartos e A Favorita (de João Emanuel Carneiro), Celebridade de (Gilberto Braga) e Senhora do Destino (de Aguinaldo Silva).
Anos 2010
O SBT descobriu um filão rentável: novelas infantis adaptadas de textos latinos. Tudo começou em 2012, com a ótima repercussão da versão de Íris Abravanel para Carrossel, sucesso da Televisa exibido pela emissora em 1991.
A Record foi perdendo a audiência e o prestígio de suas novelas. Entretanto, passou a explorar um nicho que é a cara da emissora: adaptações de histórias bíblicas, em formato de minissérie, série ou novela. O auge foi a novela Os Dez Mandamentos, de Vivian de Oliveira, em 2015.
A Globo, que vai perdendo audiência a cada ano – resultado da concorrência com a TV a cabo e novas mídias – tenta se ajustar a essa nova realidade, explorando cada vez mais as mídias sociais e investindo em streaming (Globoplay) para chamar a atenção deste público que trocou as novelas pela internet ou pela programação on demand.
Neste cenário, vale ressaltar a novela Cheias de Charme (de Filipe Miguez e Izabel de Oliveira), um case de sucesso de transmídia, e Avenida Brasil (de João Emanuel Carneiro), que soube eficazmente incorporar a linguagem do cinema e das séries americanas a uma velha história folhetinesca.
Outros destaques da década: o remake de Ti-ti-ti (de Maria Adelaide Amaral), Cordel Encantado (de Thelma Guedes e Duca Rachid), Novo Mundo (de Thereza Falcão e Alessandro Marson), A Força do Querer (de Glória Perez), Amor à Vida, Verdades Secretas, Eta Mundo Bom! e O Outro Lado do Paraíso (de Walcyr Carrasco).
Excelente resumo!
Muito interessante a história das novelas brasileiras!
Congratulações pelo brilhante resumo sobre esta arte , a qual há décadas têm servido de inspiração, educação, diversão, ferramenta de informação e críticas construtivas pela nação brasileira.
Excelente resumo!
Amei o texto, realmente as novelas são o melhor produto da tv
Adorei o texto. Realmente voce citou as melhores novelas já exibidas no Brasil. E ainda faltaram muitas. Sou jovem e sofro preconceito por gostar de novela. Mas uma boa trama sempre me prende no sofá. Abraços.
AMEI …muita informação sobre teledramaturgia…Parabens!!!!
Excelente síntese da História das Telenovelas em suas variadas fases.
Novela o Bem Amado. Uma das melhores novelas de todos os tempos.