Sinopse

Rio de Janeiro, década de 1960. Lucinda conhece Fausto Cavalcante e Arthur Brandão, empresários paulistas e sócios. A amizade não impede que exista uma rivalidade entre os rapazes. Lucinda se apaixona por Arthur, mas este, playboy convicto, se esquiva do casamento, maior sonho dela. Fausto, empenhado em disputar a moça com o amigo, lhe propõe casamento. Assim, Lucinda não foi pra cama com quem queria e acabou casando com quem não devia. Após o casamento, Fausto se mostrou um cafajeste, impedindo que Lucinda seguisse uma carreira profissional, lhe sobrando apenas as funções domésticas e a criação dos três filhos do casal: Alessandra, Tatiana e Ramon.

Mas Lucinda não se deixou domar e enfrentou o marido, indo trabalhar com um famoso decorador. Sucesso absoluto, Lucinda provocou o ódio em Fausto e o desejo em seu patrão, que a assediou, fazendo com que ela, num movimento de defesa, o empurrasse de uma escada, provocando sua morte. Desesperada, Lucinda pede a ajuda de Fausto, que colhe provas contra ela e, para sua surpresa, a chantageia: quer que ela suma, do contrário, seria mandada à cadeia acusada de assassinato. Acuada, Lucinda foge para a Europa, ferida por ter de deixar os filhos. E Fausto se encarrega de parecer que ela morreu.

São Paulo, 2001. Lucinda não existe mais. Deu lugar à internacionalmente famosa Lulu de Luxemburgo, uma diretora de arte vencedora de oito Oscars, mas que jamais esqueceu os filhos. Fausto, péssimo pai, expulsou os filhos de casa, adiantando-lhes a herança, e cada um foi para um lugar. Alessandra, queria ser escritora e foi para Roma, mas nunca conseguiu se concentrar na literatura – prefere os homens. Tatiana, que queria ser diretora de cinema, foi para Londres e torrou toda a herança. Ramon seguiu para a Suíça, onde passou por uma cirurgia de mudança de sexo e virou Ramona, transformando-se em uma estilista de talento.

No Brasil, acontece a reviravolta: Fausto desaparece, dando um golpe fenomenal nos sócios Arthur – agora viúvo com dois filhos, Ricardo e Leonardo – e Manolo Gutierrez, de família cubana, dono de um bingo. Manolo vive com a sensual mas, digamos, burra, Aurora, que não para de brigar com a avó dele, a misteriosa Gorgo. Além disso, Adriano Araújo, afilhado de Fausto e seu braço direito na direção do resort Jardim do Éden, conspira contra tudo e todos para chegar à presidência da empresa, ajudado pela amante, a volúvel e interesseira Valentine, noiva de Arthur, que nem desconfia das reais intenções da moça.

Sabendo que o pai desapareceu, Alessandra e Tatiana decidem voltar para o Brasil. Desembarcam em São Paulo e, sempre brigando, conseguem ser as presidentas do Jardim do Éden, para desespero de Adriano. Ramon, ou melhor, Ramona, assim que coloca o salto no Brasil, provoca a ira nas irmãs e o amor em Leonardo, o machista filho de Arthur que, quando criança, a humilhava e maltratava. Porém, há ainda uma quarta irmã, filha bastarda de Fausto: Rosalva, uma pernambucana sem papas na língua que vai para São Paulo com a família, sem saber quem é o seu pai e muito menos que ele depositou em seu nome milhões de dólares em uma conta em Nova Iorque.

Globo – 19h
de 27 de agosto de 2001
a 19 de janeiro de 2002
125 capítulos

novela de Sílvio de Abreu
escrita por Sílvio de Abreu, Alcides Nogueira e Bosco Brasil
colaboração de Sandra Louzada
direção de Marcelo Travesso e Marcus Alvisi
direção geral de Jorge Fernando
núcleo Jorge Fernando

Novela anterior no horário
Um Anjo Caiu do Céu

Novela posterior
Desejos de Mulher

FERNANDA MONTENEGRO – Lulu de Luxemburgo (Lucinda Maria Barbosa)
RAUL CORTEZ – Arthur Brandão
TONY RAMOS – Manolo Gutierrez
REGINA CASÉ – Rosalva Gislene Rocha
THIAGO LACERDA – Adriano Araújo
ANDRÉA BELTRÃO – Tatiana Cavalcante
BETE COELHO – Alessandra Cavalcante
CLÁUDIA RAIA – Ramona / Ramon Cavalcante
ALEXANDRE BORGES – Leonardo Brandão
REYNALDO GIANECCHINI – Ricardo Brandão
CLÁUDIA JIMENEZ – Dagmar Cerqueira (Dadá Fortuna)
CLÁUDIA OHANA – Aurora (Orora Anarfabeta)
DIOGO VILELA – Webster Pereira
TUCA ANDRADA – Nico (Nicolau)
LAVÍNIA VLASAK – Valentine Ventura
YONÁ MAGALHÃES – Violante
LULO SCROBACK – Waldeck (Valdeci Ventura)
PATRÍCIA TRAVASSOS – Milagros Quintana
CLEYDE YÁCONIS – Dona Gorgo
FLÁVIO MIGLIACCIO – Barnabé
MÁRIO FRIAS – Diego
PRISCILA FANTIN – Joana
ELIAS GLEIZER – Seu Dedé
VIRGÍNIA CAVENDISH – Maria Leopoldina
CRISTINA PEREIRA – Divina
JACQUELINE LAURENCE – Margot de Montparnasse
NELSON FREITAS JR. – Clóvis
BRUNO GAGLIASSO – José
PEDRO GARCIA – Pedro
GUSTAVO FALCÃO – Faísca
VIVIANE NOVAES – Érica
JOANA MEDEIROS – Milena
HILDA REBELLO – Dona Geralda
MARCELO BARROS – Polenta

as crianças
ANA BEATRIZ CISNEIROS – Amadinha (filha caçula de Rosalva)
FELIPE LATGÉ – Felipe Augusto (filho de Webster e Maria Leopoldina)
ISABELA MOTTA – Maria Elizabeth (filha de Webster e Maria Leopoldina)

e
ADÉLIA LAZARI
ADRIANO GARIB – médico
ANA CARBATTI – Luzineide (amante de Edmilson)
ANDRÉ VIEIRA
BÁRBARA PAZ – namorada de Ricardo
CASTRO GONZAGA – padre que casa Rosalva e Nicolau e Joana e Diego
CISSA GUIMARÃES como ela mesma
CLÁUDIA LIRA – Dalete (amante de Edmilson)
CLÁUDIO LINS – Fausto (jovem)
DANIELA CICARELLI – Larissa (namorada de Ricardo)
DAVID HERMAN – Mr. Andrews
DÊNIS DERKIAN – advogado
EDGAR AMORIM – Setembrino
EDSON CELULARI – Edimilson Rocha (marido de Rosalva, morre no início)
EMILIANO QUEIRÓZ – João Alberto Araújo (pai de Adriano)
ERNESTO PICCOLO – diretor dos testes de Webster para comerciais
FERNANDA TORRES – Lulu (jovem)
FERNANDO BENÉVOLO
FRANCISCO CUOCO – Fausto Cavalcante (marido de Lulu, sócio de Arthur e Manolo, nos quais deu um golpe)
FRANCISCO FORTES
HENRI PAGNONCELLI – Comendador Maringoni
HENRIQUE TAXMAN – Arthur (jovem)
ISABELA CUNHA
ISADORA RIBEIRO – Madalena
JOÃO JÚNIOR
JONATHAN NOGUEIRA – contra-regra
JÚNIOR LISBOA
KENIA COSTA
LÍCIA MAGNA – avó de Setembrino
LUCY MAFRA – mulher que leva a filha para fazer um teste na televisão
MALU VALLE – Sandra (enfermeira de Ricardo)
MÁRCIA MARIA – cliente de Lulu (na primeira fase)
MARIA ALVES – Jussara (enfermeira de João Alberto)
MARIANA KUPFER – amante de Leonardo
MARIA SÍLVIA – mendiga
MÁRIO CARDOSO – Dr. Aírton (advogado de Manolo)
MAURÍCIO GONÇALVES – Dr. Martinez
NORTON NASCIMENTO – Investigador Marcelo
OSWALDO LOUREIRO – delegado
PAULO GUILHERME
RAPHAEL MOLINA – delegado
REGINA REMENCIUS – Ivone (enfermeira)
RICARDO PAVÃO – médico
ROBERTO BATAGLIN – ladrão em Las Vegas
ROBERTO PIRILO – patrocinador do programa de Tatiana
RÔMULO MEDEIROS
ROSAMARIA MURTINHO – empresária rica, nova vítima de Adriano
SAMANTA PRECIOSO – Mônica (namorada de Ricardo, no início)
SILVIO DE ABREU – anuncia e entrega o Oscar de direção de arte a Lulu de Luxemburgo
WALDIR SANTANNA – juiz de boxe
YEDA DANTAS
Mangabeira
Jurandir
Lord X

– núcleo de LUCINDA MARIA BARBOSA (Fernanda Montenegro), que foi afastada da família pelo marido e não vê os filhos há trinta anos. Vivendo nos Estados Unidos, tornou-se uma famosa figurinista da indústria cinematográfica, conhecida pelo pseudônimo LULU DE LUXEMBURGO. Decide voltar ao Brasil para recuperar o tempo perdido:
o marido FAUSTO CAVALCANTE (Francisco Cuoco), empresário inescrupuloso responsável pelo exílio de Lulu no exterior e por privá-la de seu contato com os filhos. Ao dar um golpe em seus sócios no resort Jardim do Éden, Fausto desaparece e, quando retorna, é assassinado em sua
mansão
as filhas ALESSANDRA (Bete Coelho) e TATIANA (Andréa Beltrão), que vivem às turras, brigando por tudo e em especial pela fortuna da família, e RAMONA (Cláudia Raia), que nasceu RAMON e mudou de sexo através de uma operação
a secretária e amiga MILAGROS (Patrícia Travassos), mexicana que se atrapalha entre o espanhol e o português na hora de falar
o mau-caráter ADRIANO (Thiago Lacerda), afilhado de Fausto, filho de um empregado. Ambicioso, pretende se livrar dos herdeiros e tomar para si os negócios do padrinho. Envolve- se com Tatiana e Alessandra
a governanta MARGOT (Jacqueline Laurence), que sabia do paradeiro de Fausto no período em que ele esteve desaparecido.

– núcleo de ARTHUR BRANDÃO (Raul Cortez), apaixonado por Lulu desde a juventude e que teve a namorada roubada pelo amigo Fausto. Elegante, bom caráter, fica confuso ao se ver vítima do golpe do sócio e com a volta de Lulu, que ele acreditava estar morta:
os filhos bonitões que vivem rodeados de namoradas: LEONARDO (Alexandre Borges), que se apaixona por Ramona sem saber que ela é transexual, e o modelo RICARDO (Reynaldo Gianecchini)
a governanta DIVINA (Cristina Pereira), que cuida de todos
a secretária MILENA (Joana Medeiros), sobrinha de Margot.

– núcleo de MANOLO GUTIERREZ (Tony Ramos), cubano cafona que também é sócio de Fausto no resort e deseja se vingar ao ser vítima do golpe do empresário. É dono também de um bingo:
a amante AURORA (Cláudia Ohana), analfabeta, que resolve se letrar para deixar de passar vergonha e ser reconhecida apenas por sua beleza e suas formas
a avó DONA GORGO (Cleyde Yaconis), senhora cubana de 97 anos que detesta Aurora
o filho DIEGO (Mário Frias), que Manolo quer ver se tornar um grande lutador em seu ringue de boxe, desejo contrário ao do rapaz, que deseja trabalhar com moda
o amigo BARNABÉ (Flávio Migliaccio), que foi treinador de boxe de Manolo e hoje é seu sócio na academia de boxe, com a missão de fazer de Diego o boxeador que o pai quer que ele seja
a funcionária no bingo DAGMAR (Cláudia Jimenez), que vende doces e sonha em conquistar Ricardo Brandão. Para se aproximar dele passa-se por homem e ganha o papel de seu amigo numa série de TV escrita por Tatiana, usando seu nome e não o apelido DADÁ. A relação com Dagmar desperta dúvidas em Ricardo quanto a sua heterossexualidade, já que para ele Dagmar é homem
o advogado CLÓVIS (Nelson Freitas Jr.).

– núcleo de ROSALVA GISLENE (Regina Casé), nordestina que se muda para a vizinhança de Manolo com a família e desconfia das atividades do cubano:
o marido EDMILSON (Edson Celulari, numa participação), que morre no início
o sogro SEU DEDÉ (Elias Gleizer), pai de Edmilson
os filhos JOANA (Priscila Fantin), que deseja ser lutadora de boxe e se apaixona por Diego para desespero da mãe,
PEDRO (Pedro Garcia Netto), JOSÉ (Bruno Gagliasso) e a pequena AMADA (Ana Beatriz Cisneiros)
o parente distante NICOLAU, o NICO (Tuca Andrada), que se envolve com Rosalva
o banqueiro MR. ANDREWS (David Herman), que entra em contato com Rosalva para lhe falar a respeito de seus direitos. Descobre-se ao longo da trama que ela é filha de Fausto Cavalcante com uma empregada de sua casa, tendo por isso direito à herança dele.

– núcleo de VALENTINE (Lavínia Vlasak), a jovem noiva de Arthur que está com ele por interesse e o trai com Adriano. Ao final revela-se que ela é a assassina de Fausto Cavalcante, que matou pensando ser Adriano:
a mãe VIOLANTE (Yoná Magalhães), mulher ambiciosa que incentiva a filha a se envolver com Arthur por conta de seu dinheiro
o irmão VALDECI, que prefere ser chamado de WALDECK (Lulo Scroback), trabalha como personal trainer na academia de ginástica do Jardim do Éden. Se envolve com Milagros
a prima ÉRICA (Viviane Ribeiro), que aparece no meio da novela e é disputada por Pedro e José
o jovem FAÍSCA (Gustavo Falcão), surdo-mudo, apaixonado por Valentine.

– núcleo de WEBSTER (Diogo Vilela), ator fracassado que começa a dar aulas de português para Aurora e se apaixona por ela, despertando o ciúme de Manolo:
a mulher MARIA LEOPOLDINA (Virgínia Cavendish), secretária de Adriano no Jardim do Éden. Muito bonita e talentosa na profissão, colabora com os planos do chefe. Ela é quem coloca dinheiro em casa, enquanto Webster cuida das tarefas domésticas e dos filhos do casal, os pequenos FELIPE AUGUSTO (Felipe Latgé) e MARIA ELIZABETH (Isabella Motta).

– outros personagens:
o pai de Adriano, JOÃO ALBERTO (Emiliano Queiroz), que vive num asilo
o DELEGADO (Oswaldo Loureiro) e o INVESTIGADOR MARCELO (Norton Nascimento), que investigam o assassinato de Fausto
os vizinhos de Manolo e Rosalva, DONA GERALDA (Hilda Rebello) e seu filho POLENTA (Marcelo Barros).

Cordel sudestino

Como sugeria o título completo – A Incrível Batalha das Filhas da Mãe nos Jardins do Éden – a novela tinha a proposta de ser uma comédia rasgada, ao estilo das tramas de Silvio de Abreu dirigidas por Jorge Fernando para o horário das sete. Com esse espírito, a produção misturava farsa e chanchada a uma narrativa folhetinesca.

A intenção era contar a história de uma maneira próxima ao que seria um cordel sulista-paulistano – ou “sudestino”. Para isso, um rap, composto especialmente de acordo com o que acontecia nos capítulos, unia e explicava ações e acontecimentos. Por outro lado, as vendas internacionais foram prejudicadas pelos raps: traduzidos para outros idiomas, eles perdiam o sentido e a rima, ficando deslocados do resto.

Diferente de outras novelas, As Filhas da Mãe, foi escrita para um elenco pré-escalado e já aprovado pela direção da emissora. Os personagens foram criados levando-se em conta as características particulares de cada intérprete, as facilidades na composição dos tipos e o tipo físico de cada um deles: Fernanda Montenegro, Tony Ramos, Regina Casé, Raul Cortez, Cláudia Raia, Cláudia Jimenez, Cláudia Ohana e outros.

Audiência baixa

Apesar da proposta inovadora e do elenco estelar (ou por causa dele), a audiência ficou muito abaixo da esperada, fazendo com que a duração da novela fosse encurtada. A ideia era levá-la até depois do Carnaval de 2002, mas a trama foi concluída em janeiro. A emissora anunciou que foi uma estratégia para lançar a próxima atração das sete, já que não queria encavalar duas estreias, a das 18 horas (Coração de Estudante) e a das 19 horas (Desejos de Mulher).
“Foi uma maneira elegante de dizer que a novela ia sair antes porque não estava dando os índices de audiência esperados”, desabafou Silvio de Abreu em entrevista ao TV Folha, em 20/01/2002.

Silvio explicou ao livro “Autores, Histórias da Teledramaturgia” (do Projeto Memória Globo):
“Foi um salto no escuro, talvez o mais audacioso que fizemos. Jorge Fernando também embarcou na loucura sem dúvidas ou restrições. Nós mudamos completamente a maneira de se narrar a história de uma novela. Desprezamos tudo o que é sucesso garantido: personagem central, história central, personagem de identificação, histórias em que o mocinho casa com a mocinha. Fizemos tudo ao contrário. (…)
No nosso entusiasmo sempre crescente, achávamos que isso daria um ar novo para a novela, que as pessoas iriam se divertir com aquelas novas possibilidades. Mas não contávamos com o conservadorismo do público. A novela teve um sucesso imenso com o público das classes A e B, e foi um fracasso com as classes C,D e E.”

A Globo ofereceu duas alternativas a Silvio de Abreu: modificar a novela em nome do aumento da audiência, necessário já que em seguida entravam o Jornal Nacional e a novela das nove; ou manter a proposta com o mínimo de alterações, mas encurtando o projeto com sua retirada dez semanas (ou 60 capítulos) antes do previsto.
Escolheu-se a segunda opção e As Filhas da Mãe saiu do ar em janeiro de 2002, totalizando 125 capítulos, mas sem se descaracterizar e respeitando o público que a entendeu, aceitou e acompanhou desde o início. (“Novela, a Obra Aberta e Seus Problemas”, Fábio Costa)

Especificamente sobre As Filhas da Mãe, Luís Erlanger, então diretor da Central Globo de Comunicação, fez elogios:
“Do ponto de vista artístico, a novela foi um êxito total, porque está dentro dos princípios da emissora apostar em novos formatos. Nunca houve na televisão brasileira uma inovação tão grande em termos de linguagem e edição, mas não houve assimilação popular.”

Culpa do público?

O autor queixou-se ao TV Folha que o público não entendia sua novela: “Eu queria fazer algo mais sofisticado. As pesquisas mostraram que o público não entendia nada da novela. Nem mesmo percebia que era uma comédia. Eles enxergavam como drama. Não sabem o que é Óscar, Hollywood ou transexual, não têm referências, e, mesmo que eu explicasse, continuariam não entendendo. Não há compreensão intelectual, só emocional. Acharam bonita a relação da Ramona [Cláudia Raia] com o Leonardo [Alexandre Borges], mas não entenderam o preconceito dele que impedia o romance!”

E justificando a não aceitação do público: “E houve outro problema: a novela competia com programas policiais e, no segundo dia de veiculação, a filha do Silvio Santos foi sequestrada. O povo não tinha paciência de esperar o Jornal Nacional e migrou para outros canais. Achavam que, mesmo que ficassem uma semana sem assistir à novela, continuariam entendendo, como sempre acontece. Depois, veio a Semana da Pátria, época em que, historicamente, a audiência cai. A terceira semana começou bem, mas aí aconteceu o atentado ao World Trade Center [11 de setembro de 2001]. Quando o telespectador se voltou para a novela, não entendeu nada.” (TV Folha, 20/01/2002)

Jorge Fernando, o diretor geral, comentou à época:
“Nós queríamos amarrar pelo rap cinco sitcoms distintas com duas estrelas cada. Mas o público sentiu falta de uma história central. E também não entendiam o humor. A gente fez as duas irmãs birrentas como duas doidas, meio Cinderela. Quando chegou a pesquisa, vimos que o público achava agressivo. Mas foi o nosso melhor trabalho. Foi minha melhor direção, de ator, de cena e de equipe. Nunca ganhamos 4 estrelas na Folha, só agora. O risco valeu a pena.”
E ainda: “A Cláudia Raia entrava no capítulo 8. Foi quando teve aquele 11 de setembro horroroso. O mundo estava acabando, ninguém queria ver novela. Eu mesmo só via gravada, porque eu queria saber o que estava acontecendo (em Nova York).”

Outra pedra no sapato de As Filhas da Mãe foi a concorrência com a novela infantil mexicana Carinha de Anjo, exibida pelo SBT entre julho de 2001 e fevereiro de 2002. A novela de Silvio de Abreu estreou quando a produção importada da concorrente já estava consolidada, com público cativo, enfrentando-a ao longo de toda a sua exibição.

Elenco

Silvio de Abreu prestou uma homenagem à amiga Fernanda Montenegro, protagonista da novela. Em 1999, a atriz concorreu ao Óscar por sua atuação no filme Central do Brasil (de Walter Salles), mas perdeu o prêmio para a norte-americana Gwyneth Paltrow, do filme Shakespeare Apaixonado (de John Madden).
Na trama da novela, Fernanda vivia Lulu de Luxemburgo, uma diretora de arte reconhecida internacionalmente. No primeiro capítulo, em uma reprodução da cerimônia do Óscar, Lulu é consagrada vencedora do prêmio de direção de arte. Detalhe: quem anuncia (em inglês) e lhe entrega a estatueta é o próprio Silvio de Abreu.

Cláudia Raia viveu Ramona, a primeira transexual de nossas novelas, que se apaixonava por Leonardo (Alexandre Borges), que, por sua vez, passava a rejeitá-la quando descobria que ela era uma transexual. Ramona teve problemas com o Ministério da Justiça, que, por causa dela, não queria liberar a novela para o horário das 19 horas.
Aparentemente, não houve rejeição do público pelo romance dos dois. Certamente, se, na época, Ramona tivesse sido interpretada por uma atriz transexual, o público não aceitaria os beijos da personagem trocados com Leonardo. Contudo, se As Filhas da Mãe fosse feita hoje, seria impensável a personagem não ser vivida por uma atriz que não fosse uma transexual de verdade.

O casal formado por Dadá (Cláudia Jimenez) e Ricardo (Reynaldo Gianecchini) causou estranhamento, já que ela se aproximava do ídolo se passando por homem, ao ganhar em um teste o papel de melhor amigo do personagem de Ricardo em um seriado de TV. Seria Ricardo gay, já que começou a se sentir atraído por Dadá, embora não soubesse que ela era mulher? E seu irmão, Leonardo (Alexandre Borges), seria gay por se apaixonar por Ramona, que um dia foi homem, mas era mulher depois da operação? (“Novela, a Obra Aberta e Seus Problemas”, Fábio Costa)

O personagem de Mário Frias tinha inclinações artísticas, enquanto a de Priscila Fantin queria ser praticante de luta livre. Os dois se envolviam romanticamente.
Assim, Silvio de Abreu voltou a explorar os preconceitos em relação aos papéis femininos e masculinos. O tema já havia sido levantado em Cambalacho (1986), em que Edson Celulari interpretava um bailarino e Débora Bloch vivia uma mecânica de automóveis. (*)

Por sua atuação na novela, Tony Ramos foi eleito pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) o melhor ator na televisão em 2001. Também foi premiado com o Troféu Imprensa de melhor ator do ano.
Por sugestão de sua mulher Lidiane, o ator Tony Ramos propôs que o seu personagem andasse com vários telefones celulares em sua capanga, cada um com um toque e cada um para um objetivo. Manolo se atrapalhava todo com os quatro aparelhos. (*)

Primeira novela na Globo de Bruno Gagliasso e Priscila Fantin, que tinham trabalhado anteriormente em Malhação.

Cenografia e figurinos

O fictício resort Jardim do Éden foi erguido em uma área de 12 mil m2 no então parque aquático Rio Water Planet, em Vargem Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro. A edificação lembrava a mansão dos O´Hara no filme … E o Vento Levou (1939), com dourados, escadarias, candelabros, espelhos, lago com chafariz e luzes coloridas, além de um imenso jardim.
A novela também contou com uma cidade cenográfica na Central Globo de Produção (Projac), cenário dos moradores da Vila Havana. Os primeiros capítulos tiveram cenas gravadas em Los Angeles, Las Vegas, Roma e Londres. (*)

Os personagens tinham figurinos criativos, alguns inspirados em personalidades. O visual exótico de Lulu de Luxemburgo (Fernanda Montenegro), por exemplo, tinha como referência Peggy Guggenheim, colecionadora de arte e fundadora do Museu Guggenheim de Nova York. As irmãs Alessandra (Bete Coelho) e Tatiana (Andréa Beltrão) se odiavam, mas, inexplicavelmente, tinham sempre as mesmas ideias e escolhiam os mesmos modelos, onde predominava o estilo “punk chique”. A Ramona de Cláudia Raia vestia um figurino que explorava a feminilidade, por meio de vestidos, fendas, crepes, sedas e mousselines. Manolo Gutierrez (Tony Ramos) fazia a linha latin lover, um cubano cafona que abusava dos brilhos e dourados e cujo penteado e costeletas bem marcadas lembravam o cantor Elvis Presley. Já o figurino de Valentine (Lavínia Vlasak), homenageava Audrey Hepburn e o estilista Givenchy, como a bonequinha de luxo dos anos 1960. Destaque também para Milagros (Patricya Travassos), que representava uma mistura de Frida Khalo e Almodóvar. (*)

Uma estilista de Belém do Pará, outra de Recife, uma da Bahia e outro do Rio de Janeiro trabalharam em conjunto com Cao Albuquerque, um dos figurinistas da novela, na idealização e construção do figurino de Ramona. As roupas tinham silicone, folha e pó da casca do pirarucu, por exemplo. Era um figurino natural, já que ela era uma estilista que só trabalhava com materiais orgânicos. Para ajudar na caracterização da personagem, Claudia Raia emagreceu e passou a exibir contornos musculares mais definidos. De um lado a delicadeza, por estar mais magra, mas, de outro, um pouco mais de musculatura nos braços para dar um toque masculino à personagem. (*)

Os figurinos de Tatiana e Alessandra viraram roupas de boneca. Em uma parceria da Globo Marcas com a indústria de brinquedos Estrela, os modelitos das irmãs inauguraram o projeto Susi Dramaturgia, com o lançamento de uma cartela de roupas que imitavam os modelos usados pelas personagens.
Também foi lançado à época da novela um jogo cartonado, o “Bingo do Manolo”, em referência à casa de bingo, na trama, do personagem vivido por Tony Ramos. (*)

Abertura

A abertura da novela apresentava bonecos manipulados pela companhia teatral de marionetes O Navegante, em um palco construído especialmente para a gravação, que incluía cinco painéis com fundo representando o Brasil. (*)

E mais

Filha da Mãe foi o primeiro título pensando para a novela Bebê a Bordo, de Carlos Lombardi, em 1988.

(*) Site Memória Globo

Trilha sonora nacional

01. ELA É BAMBA – Ana Carolina (tema de Rosalva)
02. ACIMA DO SOL – Skank (tema de Diego e Joana)
03. ODARA – Lulo (tema de Waldeck)
04. PRIMAVERA – Maria Bethânia (tema de Lulu de Luxemburgo e Arthur)
05. SEM PARAR – Gabriel, o Pensador (tema de Tatiana)
06. DREAM – John Pizzarelli (tema de Ricardo)
07. JANELA INDISCRETA – Lulu Santos (tema de Leonardo)
08. QUÍMICA PERFEITA – Banda Eva (tema de Manolo e Aurora)
09. SÃO PAULO SP – Fernanda Abreu (tema geral)
10. OS OLHOS DO MEU AMOR – Sylvia Massari (tema de Dagmar)
11. ORORA ANALFABETA – Exaltasamba (tema de Aurora)
12. YOU DON’T KNOW ME – B.B. King (tema de Ramona e Leonardo)
13. MERO DETALHE – Lenine (tema de Adriano)
14. FUCK THE FASHION – Vinny (tema de Alessandra)
15. DANCING IN THE DARK – Diana Krall (tema de Arthur)
16. VAI PEGAR – Zé Ricardo (tema de Webster)
17. ALÔ ALÔ BRASIL – Eduardo Dussek (tema de abertura)

Sonoplastia: Nelson Zeitoune e Raphael Salles
Produção musical: Mú Carvalho e Rodolfo Rebuzzi
Direção musical: Mariozinho Rocha

Trilha sonora internacional

01. MIRAME A LOS OJOS – Paulina Rubio (tema de Milagros)
02. WHEN YOU TOLD ME YOU LOVED ME – Jessica Simpson (tema de Valentine)
03. ME, MYSELF & I – Jive Jones (tema de Pedro, Zeca e Érika)
04. EMOTION – Destiny’s Child (tema de Ricardo e Valentine)
05. BAILA SEXY THING – Zucchero (tema de Alessandra)
06. I BELIEVE IN YOU – Joe (with N´Sync) (tema de Nico)
07. ETERNAL FLAME – Atomic Kitten (tema de Diego e Joana)
08. YOUR SONG – Billy Paul (tema do Jardim do Éden)
09. DANCE ANYMORE – Double You (tema de Adriano)
10. PRA VOCÊ EU DIGO SIM (IF I FELL) – Rita Lee (tema de Lulu de Luxemburgo e Arthur)
11. SE NOS MUERE EL AMOR – Ricardo Arjona (tema de Violante e Barnabé)
12. ADDICTED TO LOVE – Adriana Mezzadri (tema de Violante)
13. COLO DE MENINA – Rastapé (tema de Rosalva)
14. SELFISH – N´Sync (tema de Tatiana e Webster)
15. HEROE – Enrique Iglesias
16. THE LAND – Ibiza

Seleção de repertório: André Werneck

Tema de abertura: ALÔ ALÔ BRASIL – Eduardo Dussek

Alô, alô
Quem fala?
É do Brasil!
Alô, alô, alô, alô
É da terra do anil

Alô, alô, alô, alô
Nós vamos apresentar
A maior novela
E por tabela vai rolar
Um show prá lá de popular

Laranja lima, abacate, limão doce, tangerina
Elas vão sambar também
As filhas da mãe e também cinderelas
O pandeiro é de vocês
Mas os balangandãs são delas

Com as palmeiras nas praias flutuar
Com a cachaça nos bares vão rolar
Elas querem é rosetar
Nesse Brasil, nesse Brasil
De céu, de mar
Oba!

Veja também

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Deus nos Acuda

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A Próxima Vítima

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Torre de Babel

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Belíssima